Foto: Sandra Hiller
O desenho da ponte é justo e firme, calmo e exato.
Nada poderá perturbar as suas linhas definitivas.
A sua arquitetura equilibra-se no ar
como um navio na água, uma nuvem no espaço.
Embaixo da ponte há ondas e sombras.
Os mendigos dormem enrodilhados nos cantos.
Não têm forma humana. São sacos no chão.
Por momentos parece ouvir-se choro de uma criança.
A água embaixo é suja,
o óleo coagula, em nódoas luminosas, reflexos lacrimejantes.
Um vulto debruçado sobre as águas
contempla o mundo náufrago.
A tristeza cai da ponte
como a poesia cai do céu.
O homem está embaixo aparando as migalhas do infinito.
A ponte é sombria como as prisões.
Os que andam sobre a ponte
sentem os pés puxados para o abismo.
Ali tudo é iminente e irreparável,
dali se vê a ameaça que paira.
A ponte é um navio ancorado.
Ali repousam os fatigados,
ouvindo o som das águas, a queixa infindável,
infindável, infindável...
Um apito dá gritos
a princípio crescendo em uivos, depois mantendo bem alto o apelo desesperado.
Passam navios. Tiros. Trovões.
Quando virá o fim do mundo?
Por cima da ponte se cruzam
reflexos de fogo, relâmpagos súbitos, misteriosos sinais.
Que combinam entre si os astros, inimigos da Terra?
Quando virá o fim dos homens?
A ponte pensa...
(Dante Milano)
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