Capibaribe

Foto: André Domingos

II. Paisagem do Capibaribe

Entre a paisagem
o rio fluía
como uma espada de líquido espesso.
Como um cão
humilde e espesso.

Entre a paisagem
(fluía)
de homens plantados na lama;
de casas de lama
plantadas em ilhas
coaguladas na lama;
paisagem de anfíbios
de lama e lama.

Como o rio
aqueles homens
são como cães sem plumas
(um cão sem plumas é mais
que um cão saqueado;
é mais
que um cão assassinado.

Um cão sem plumas
é quando uma árvore sem voz.
É quando de um pássaro
suas raízes no ar.
É quando a alguma coisa
roem tão fundo
até o que não tem).

(João Cabral de Melo Neto)

João Cabral possui lindos retratos em torno do Capibaribe, uma de suas grandes inspirações... este é apenas um trecho do belíssimo poema, leia-o por completo em 
http://www.algumapoesia.com.br/poesia/poesianet001.htm

João Negreiros

Hoje faremos algo diferente: o poeta recitará o seu poema.
João Negreiros é um poeta português contemporâneo que já ganhou vários prêmios em Portugal e será, em breve, editado no Brasil.


Quem sentir dificuldade com o português de Portugal, pode lê-lo no




Sonho de poeta


Quem dera fosse meu
o poema de amor definitivo
se amar fosse o bastante
poder eu poderia
pudera, às vezes,
parece ser esse
meu único destino
Mas vem o vento e leva
as palavras que digo minha canção de amigo. Um sonho de poeta
não vale o instante vivo.
Pode que muita gente
veja no que escrevo
tudo que sente
e vibre, e chore e ria como eu, antigamente, quando não sabia
que não há um verso, amor,
que te contente.


(Alice Ruiz)


Alice está sempre presente no blog, com seus lindos poemas!

Sobre formas



Queria transformar o vento.
Dar ao vento uma forma concreta e apta a foto.
Eu precisava pelo menos de enxergar uma parte física do vento: uma costela, o olho...
Mas a forma do vento me fugia que nem as formas de uma voz.
Quando se disse que o vento empurrava a canoa do índio para o barranco
imaginei o vento pintado de urucum a empurrar a canoa do índio para o barranco.
Mas essa imagem me pareceu imprecisa ainda.
Estava quase a desistir quando me lembrei do menino montado no cavalo do vento que lera em Shakespeare.
Imaginei as crinas soltas do vento a disparar pelos prados com o menino.
Fotografei aquele vento de crinas soltas.


(Manoel de Barros)


Acho que concordo com a fotografia de Manoel...